Crônica de Carnaval - Pisando na Jaca por Yvone Miller

Foto: Arquivo Prefeitura de Recife

PISANDO NA JACA por YVONNE MILLER (@yvonnemillerin)

Quando me mudei para Pernambuco, fiz uma promessa: aprenderia a brincar carnaval. “Pois bora, no sábado tem um bloco tradicional que vocês vão adorar”, assegura nossa nova amiga pernambucana. Tenho minhas dúvidas, mas sábado estamos lá. A praça já está lotada, e nossa amiga acena do meio da multidão. Respiro fundo e mergulho no mar de glitter e sombrinhas coloridas. Emerjo ao lado de um grupo de mulheres com chapéus pontiagudos e cartazes nas mãos: “Na atual conjuntura medieval estamos do lado das bruxas.” Eu acho é justo e já começo a me sentir mais à vontade quando de repente o bloco se põe em marcha. Nossa amiga-conhecedora-de-carnaval recomenda ficarmos bem pertinho da banda para curtir ao máximo. 80% dos foliões tiveram a mesma ideia, mas aí vamos. Prensada entre minha esposa de um lado e a amiga do outro, peitos desconhecidos grudados nas minhas escápulas e minha barriga se esfregando na costa do homem suado à minha frente, flutuo pela rua, os trompetes gritando no meu ouvido. Um carro faz questão de abrir caminho entre os foliões. Os da frente param, os de trás empurram, a banda toca. Meus pés nem encostam no chão, mas tem pessoas que ainda assim conseguem dançar. Finalmente o carro passou. Ganho um mínimo de ar à minha volta, meus pés descem ao chão e retomo a respiração. Consigo até sorrir um pouco. Nossa amiga acha que ficamos longe da banda e nos puxa de novo pro meio. São só 2km de trajeto, penso, e nas próximas horas esse será meu mantra de salvação. Alguém pisa na minha chinela e continuo com um pé descalço – 2km. Quase tenho um olho arrancado por uma sombrinha – 2km. A banda canta dos coqueirais de Olinda enquanto um senhor barrigudo com uma jaca na cabeça termina sua coreografia no meu pé – 2km (mancando). Após uma hora percebo que mal saímos da praça. Finalizo os 2km na calçada. “Não gostou?”, pergunta nossa amiga depois, incrédula. “Adorei”, respondo. “Só que prefiro respirar.”

Comentários

Postagens mais visitadas